The great gig in the sky
Extraído do livro The Dark Side of the Moon: a obra-prima do Pink Floyd segundo a psicologia junguiana (ed. 2012, esgotada)
The Great Gig in the Sky, desenvolvida a partir da peça The Mortality Sequence, traz a questão da morte, conforme se pode antever no título da música que lhe deu origem, e na fala posteriormente adicionada a ela.
(Eu nunca tive medo de morrer, qualquer hora pode acontecer. Por que eu deveria ter medo de morrer? Não há razão para isso, algum dia você tem que ir. Eu nunca disse que tinha medo de morrer)
Embora a morte seja o tema principal de The Great Gig in the Sky, ela já vem sendo abordada em suas mais variadas nuances desde o início do disco.
Assim, em Breathe ela é a precoce sepultura, o aspecto devorador do inconsciente, que a exemplo da Esfinge, aniquila quem não compreende os seus segredos, trazendo não só a possibilidade da morte física, mas a iminência de uma morte espiritual, que aprisiona o indivíduo e paralisa o desenvolvimento de sua personalidade.
Em On the Run, que termina ao som abrupto de uma forte explosão, a morte revela o seu sentido de fatalidade, podendo também estar relacionada à ideia de morte prematura, ou mesmo suicídio.
Em Time, onde a vida foi sentida em toda sua finitude e transitoriedade, a morte foi posta como uma realidade inexorável, ainda que o ser humano queira evitá-la, ou ignorá-la, como algo temido e indesejável.
(Se você está ouvindo este sussurro você está morrendo)
O fato é que a morte é um mistério perturbador para o ser humano, podendo ser considerada, por assim dizer, o lado oculto da vida, aquilo que verdadeiramente desconhecemos, como as profundezas do inconsciente, que em seus mistérios é comumente associado ao Hades, o mundo subterrâneo dos mortos, o lugar para onde nos encaminhamos ao som dos sinos, como em Breathe (reprise).
Enquanto mistério, a morte pode vir acompanhada de sentimentos contraditórios de dor e alegria.
Assim, sob o ponto de vista do ego, ela é uma terrível brutalidade, pois “um ser humano é arrancado da vida e o que permanece é um silêncio mortal e gelado. Não há mais esperança de estabelecer qualquer relação: todas as pontes estão cortadas” (JUNG, 1963, p.272)
Porém, sob o ponto de vista da alma, a morte é um acontecimento importante, o que contraria a posição habitual do ego, pois, com a morte, “a alma, pode-se dizer, alcança a metade que lhe falta, atinge a totalidade” (JUNG, 1963, p.273)
Essa totalidade é uma forma de encontro, ou casamento, que alude ao mais completo estado de união. Por isso muitos ritos inserem a morte num contexto de alegria e festividade, representada entre banquetes e dançarinas.
Ou seja:
“Essas manifestações mostram que a morte é sentida, por assim dizer, como uma festa” (JUNG, 1963, p.273).
Um Grande Concerto no Céu.
Nota: Em relação ao quadro A Escada de Jacó, de W. Blake, vale ressaltar que ele faz uma alusão à anatomia do ouvido humano, cujos canais auditivos são referidos por Alexander Roob, em Alquimia e Mística, como “escadaria em espiral sem fim que leva até o último céu”, p, 257. Não seria demais dizer que cada nota de The Great Gig in the Sky soa como se nos conduzisse por estes degraus em direção ao último céu, onde se daria a mais elevada coniunctio.